quarta-feira, 30 de setembro de 2009

A nossa revolução é mais embaixo.

Nós passamos boa parte do tempo nos espelhando em outras nações. Normalíssimo, considerando que tudo que nos veio de “moderno”, veio de Portugal. País entremeio, porta de entrada (ponto de passagem) para a Europa, porta de saída para o Oriente, via Mediterrâneo. Um país que soube absorver o que era trazido de outras nações. Bom, nós também fomos/somos assim. Ficamos só um pouco atordoados durante a Guerra fria, quando não soubemos/quisemos ficar de um dos lados. American way or Russian life? Uma questão difícil. Resolvemos ficar com os dois. E não ficamos com nenhum.

Dezembro/1980 (Itabuna)– Eu com 11 anos. SSP/BA. Tirar Identidade para me matricular no Ginásio (aquele onde todo mundo estudava vestido, apesar de gymnasium). Prêmio por ter avançado para a 5ª série: vou às 18 horas com minha mãe para o posto da SSP/Instituto Pedro Melo. Funcionava onde é a Escola Profissionalizante. Ficamos até às 7 da manhã. Consigo uma senha. Faço minha identidade. “Pai vou me matricular…” Todos os agentes nos tratavam como “pobres”, ou seja: estão emperrando o estado com necessidades supérfluas, como ter direito a uma identificação, que o próprio estado cria e exige. Um abraço ao Kafka (O Processo), que naquele tempo não conhecia senão pelo tratamento dos agentes da Bahia.

Fevereiro/2009 (Salvador) – Detran/BA. Vistoriar um veículo para troca de proprietário, centro de vistoria para transferência de veículos. Meus caros, ali está um legítimo representante da burocracia paquidérimica estatal (que existe tb na estrutura privada, não sejamos ingênuos). Ninguém informa nada. Manda entrar numa fila onde outras pessoas com seus carros estão. Esperar. Não sabemos qual é a lógica no atendimento, no fluxo, na rotina (um abraço ao Bacon, método? Pra que método?) O agente (vestido com uma camisa de propaganda: “você, cidadão”, do Gov. da Bahia/Detran), tal qual aquele de 1980, nos trata não como cidadãos da propaganda, mas como pedintes. O Estado da Bahia nos transforma em pedintes do serviço público. Quando termina o processo técnico de vistoria no veículo, o vistoriador senta-se e não me diz palavra. Eu pergunto: - “e agora [José]?” Ele: - “espera o carimbador”. O carimbador tem uma camisa diferenciada, branca, de propaganda do Sac Móvel. Está em outras mesas, ocupado, carimbando outros laudos de vistoria finalizados. Vem, carimba. Aí o senhor das vistorias nos manda ir ao outro prédio do Detran (central, prox. Rodoviária) para pagar a taxa (R$ 65,00) e finalizar o processo (não é o de kafka, não, é parecido), imprimir o novo doc e se tudo tiver correto, fim.

Minha conclusão: essa Bahia tão plástica, tão moldável, tão moderna, tão acolhedora consegue, pelas mãos dos governantes, ser a melhor representante da burocracia paquidérmica de que eu tenho notícia. E fico, pra finalizar, pensando numa categoria criada pelo S.B. de Holanda, “O Homem Cordial”, na tentativa de perfilar o brasileiro. Porque penso nisso? Quando estava na espera no Detran, como é um galpão improvisado – vejam que o improvisado pode até ser o galpão, não a rotina, o atendimento – o banheiro é daqueles químicos, pedi uma informação ao agente de branco, o carimbador. Ele quase me levou ao banheiro e deu descarga por mim, tal foi a solicitude na informação. Já quanto ao atendimento que me motivava estar ali, do processo de vistoria, era como um filme mudo para cegos. “Viva feliz, sorria: Wagner governador pra ….. com a Bahia.”

Em tempo, o valor do serviço é o mesmo de uma passagem SSA/Itabuna (Águia Branca). Será que um agente dessa empresa nos trataria assim? Será que continuaríamos comprando um bem ou serviço de uma empresa que nos atendesse daquela forma do SAC Móvel/Detran? Temos mais algum tempo pra pensar. Nos vemos nas eleições de 2010. Até lá.

Jailson Alves – Professor, escritor, cidadão.

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